quinta-feira, 28 de outubro de 2021

A pregação da Palavra de Deus, academia ou nada, os extremos devem ser evitados.

                A Bíblia vem carregada de informações e advertências ao povo de Deus para não se apartar da sua Palavra. Oseias 4.6 exclamou na voz do Senhor dizendo: “Meu povo perece por falta de conhecimento”. E essas recomendações se repetem, mas o povo continua negligenciando o conhecimento de Deus. O Salmo primeiro traz a advertência para o contraste entre quem medita na Palavra de Deus e os que seguem outros conselhos. Na verdade, quem não medita na Palavra, certamente, está desnorteado, sentando-se em qualquer roda de escárnio, recebendo a orientação de ímpios e de outras fontes e, por isso, não são bem-aventurados.
                No Brasil, ao contrário do que muitos pensam, os pioneiros foram mais apaixonados pelos estudos do que a geração atual que dispõe de mecanismos de facilitação da informação, como as mídias de universalização de conteúdo. Os primeiros crentes oravam e meditavam, suplicando a orientação correta para a condução do povo de Deus em santidade. A adoração e a comunhão espiritual eram, no início da Igreja Assembleia de Deus, no Brasil, ingredientes indispensáveis para receber o suprimento de vida espiritual a entregar e repartir ao seu povo. Os antigos, com temor, agiam como os discípulos nas multiplicações de pães, recebiam do Senhor e repartiam aos ouvintes famintos, que assentavam porque sabiam que seriam supridos ainda que ali não houvesse luxo material, mas o Senhor estava presente na reunião e os não despediriam sem alimento.
             O momento atual é de maiores expedientes para a organização do sermão, mas esse parece ser o fator principal que gera outros problemas: de um lado estão aqueles que encontraram a facilidade de apropriar-se de sermões prontos e abandonaram os recursos espirituais, ou seja, os responsáveis por alimentar o rebanho do Senhor não estão mais vivendo a prática da oração para saber do próprio Senhor o que ele deseja transmitir ao seu povo; de outro lado, estão aqueles que são totalmente contra aos estudos porque consideram que o Senhor os dará a Palavra ao abrir da sua boca, e, assim, espiritualizam tudo, inibem as pesquisas e os estudos sistemáticos da Palavra de Deus. Há ainda uma grande parte dos ministros do evangelho que estudam muito, mas não tem consagrado sua vida em buscar ao Senhor, por isso, não consegue ser acadêmico e ter a mensagem cristocêntrica ao mesmo tempo. Esses tipos de obreiros são nocivos na divulgação dos estudos sistemáticos porque as suas mensagens não correspondem a alguém que recebeu de Deus a Palavra da salvação. E, assim, o povo rejeita o estudo bíblico.
            Não se deve ter postura contrária a academia, pois seria negligenciar a busca pela melhor compreensão das verdades eternas, mas não se pode mecanizar a Palavra e negar a ação do Espírito Santo. Os estudos acadêmicos são importantes e necessários para ampliar a visão e oportunizar descobertas presentes no texto, mas muito mais importante são os textos revelados no contexto da Igreja em louvor a Deus e não aos homens.
Felizmente, a preparação exegética requerida para um sermão não envolve a produção de um ou dois trabalhos exegéticos por semana. Infelizmente, porém, a maioria dos pastores com preparação teológica, que aprenderam a escrever monografias exegéticas para um curso, não tiveram igual treinamento para aplicar essas habilidades à tarefa mais comum da preparação de sermões. (STUART e FEE, 2002, 312)
            Atualmente, muitos textos dos sermões não passam de retórica aperfeiçoada e a combinação correta de uma sequência de frases de efeitos para prender a atenção, cuja unidade e coerência nada tem a ver com a Palavra de Deus. Um texto para um sermão construído na mente acadêmica, sem um coração pleno de Cristo, somente atinge a mente das pessoas, mas é incapaz de mudar o coração do pecador.
                Aparentemente, a academia tem roubado a simplicidade que há em Cristo e as filosofias e conceitos humanos têm superado o entendimento dos líderes e exegetas do século XXI. Os esboços desses obreiros são vitrines que cativam a atenção de outros novos líderes nas mídias sociais. O que seria muito bom se não viesse recheada de conceitos arbitrários, pessoais, travestidos de verdades, apontando um outro evangelho e um outro Jesus, conforme Paulo já alertava aos líderes em Atos 20.27-32:
27 porque nunca deixei de vos anunciar todo o conselho de Deus. 28 Olhai, pois, por vós e por todo o rebanho sobre que o Espírito Santo vos constituiu bispos, para apascentardes a Igreja de Deus, que ele resgatou com seu próprio sangue. 29 Porque eu sei isto: que, depois da minha partida, entrarão no meio de vós lobos cruéis, que não perdoarão o rebanho. 30 E que, dentre vós mesmos, se levantarão homens que falarão coisas perversas, para atraírem os discípulos após si. 31 Portanto, vigiai, lembrando-vos de que, durante três anos, não cessei, noite e dia, de admoestar, com lágrimas, a cada um de vós. 32 Agora, pois, irmãos, encomendo-vos a Deus e à palavra da sua graça; a ele, que é poderoso para vos edificar e dar herança entre todos os santificados.
            No entanto, a pergunta é sobre o caminho que devemos seguir para que esta concepção contrária ao estudo sistemático da Palavra de Deus seja afastada de vez de muitas mentes e, principalmente dos púlpitos?
                Na contramão do que os líderes atuais estão anunciando, que o crente deve ter apenas uma vida cheia do Espírito Santo, mas sem a necessidade de realizar estudos sistemático da Palavra de Deus, porque o Espírito Santo concede e revela a sua Palavra, o Pastor Antônio Gilberto afirmava que assim como Cristo é a Palavra viva, a Bíblia é a Palavra escrita, então o crente tem a necessidade de estudar a Bíblia, porque ela é o único manual do crente na vida cristã e no trabalho do Senhor; Ela alimenta as nossas almas; e é o instrumento que o Espírito Santo usa, (Ef. 6.17); Ela enriquece espiritualmente a vida do cristão (Sl. 119.72):
Se em nós houver abundância da Palavra de Deus o Espírito Santo terá o instrumento com que operar. É preciso, pois, meditar nela (Js.1.8; Sl. 1.2). É preciso deixar que ela domine todas as esferas da nossa vida, nossos pensamentos, nosso coração e, assim, molde todo o nosso viver diário. Em suma: precisamos ficar saturados da Palavra de Deus. Um requisito primordial para Deus responder às nossas orações é estarmos saturados da sua Palavra (Jo.15.7). (SILVA, 1986, p. 11-12)
            E o próprio Jesus foi um estudioso das Escrituras. Ao pregar, usou as Escrituras para mostrar o seu tema central, Jesus. Assim, ele fala de si mesmo e do seu propósito em vir ao mundo, morrer pelos pecadores e ressuscitar, conforme registrou o evangelista Lucas 24.25-27: “E ele lhes disse: Ó néscios e tardos de coração para crer tudo o que os profetas disseram! Porventura, não convinha que o Cristo padecesse essas coisas e entrasse na sua glória? E, começando por Moisés e por todos os profetas, explicava-lhes o que dele se achava em todas as Escrituras.” Esta, certamente, foi uma grande aula que ressaltou o tema, a pessoa de Jesus. Na sua explanação estava o resumo da lei e seu cumprimento no Cristo ressurreto.
                Ao reconhecerem que ele era o Messias prometido e o Cristo ressurgido e poderoso, abandonaram o medo e a decepção e voltaram a Jerusalém a anunciar a nova era em Cristo Jesus vivo. Sobre isto declara Dockery (2005):
Embora Jesus interpretasse as Escrituras de maneira semelhante à dos exegetas judeus contemporâneos havia novidades tanto em seu método como na mensagem. Esse novo método era uma leitura cristológica, o que significava que Jesus lia o AT à luz de si mesmo. Por exemplo, em João 5 .39,40, registra-se que Jesus disse: “Vocês estudam cuidadosamente as Escrituras, porque pensam que nelas vocês têm a vida eterna. E são as Escrituras que testemunham a meu respeito (grifo do autor)”. E em João 5.46: “Se vocês cressem em Moisés, creriam em mim, pois leu a meu respeito (grifo do autor)”. Na estrada para Emaús, Jesus disse: “Como vocês custam a entender e como demoram a crer em tudo o que os profetas disseram! Não devia o Cristo sofrer estas coisas, para entrar na sua glória? E, começando por Moisés e todos os profetas, explicou-lhes o que constava a respeito dele em todas as Escrituras” (Lc 24.25-27). Jesus concebia o AT de modo cristocêntrico, e a Igreja deriva a identificação de Jesus com Israel dessa concepção de Jesus. (DOCKERY, 2005, p.12).
                A propósito, os conceitos que nortearam a compreensão dos discípulos no caminho de Emaús, também devem ser as considerações de qualquer estudioso da Palavra de Deus.
                Certamente, pastores e leigos que amam a Deus sabem o valor de um culto ao Senhor, que deve ser com ordem e com entendimento, para isso, o estudo é fundamental. O apóstolo Paulo falando aos coríntios trouxe uma maneira ordeira a ser desenvolvida nos cultos de adoração ao Senhor. Em 1 Coríntios 14.26 lemos: “Que fareis, pois, irmãos? Quando vos ajuntais, cada um de vós tem salmo, tem doutrina, tem revelação, tem língua, tem interpretação. Faça-se tudo para edificação.” Sobre o assunto, na carta de Inácio, bispo de Antioquia, aos efésios, encontramos no número treze:
“13 Tentem se reunir com maior frequência para celebrar a Eucaristia de Deus e louvá-lo. Pois quando vocês se reúnem mais vezes os poderes de Satanás são derrotados e sua capacidade de destruição é anulada pela unanimidade de sua fé. Não existe nada melhor que a paz, pela qual todos os conflitos no céu e na terra são resolvidos.” (PISETTA, 2013, p. 136)

                É notório o cuidado pastoral de Inácio por meio da orientação de congregar e ouvir a voz de Deus presente na reunião da celebração de sua ordenança.
                Atualmente, a questão se estende porque os atuais estudiosos e pensadores da Palavra de Deus têm suas próprias tendências de análise aprofundada que seduz e tenta conduzir o homem a uma crença extrabíblica ou marginal a Palavra de Deus, por isso, esses homens, como os citados por Paulo, são lobos devoradores. Que Deus nos guarde deles. E a própria Bíblia nos manda acautelarmos de tais pessoas, haja vista que os assuntos trazidos por eles não passam de armas usadas por Satanás, por meio de filosofia humana, que tendem a roubar a verdadeira mensagem do evangelho quando negam os princípios da doutrina, da fé, da verdadeira submissão a Cristo, da real posição do homem como ovelha do seu Senhor.
                Isso tudo não é novidade, já que o próprio apóstolo Paulo disse a Timóteo, em I Tm 4.1,2, que “o Espírito expressamente afirma, que nos últimos tempos apostatarão alguns da fé, dando ouvidos a espíritos enganadores, e a doutrina de demônios, pela hipocrisia de homens que falam mentira, tendo cauterizada a sua própria consciência”. A recomendação de Paulo a Timóteo foi: persista em ler, exortar em ensinar, isso porque sabia que o lugar de primazia da Palavra iria ser ignorado nos últimos dias. Ele recomendou que se pregasse a Palavra a tempo e fora de tempo, porque o povo iria desejar seus próprios mestres, mas o dever do evangelista é o combate por meio da Palavra.
            O grande desafio da Igreja hodierna está sendo o exercício cristão no seio da Igreja, isso porque os enfrentamentos contra os falsos mestres estão vindo pelas mídias eletrônicas e seminários desprovidos de Igrejas, apenas centrados em “mestres” segundo as concepções humanas. Nesta hora, somos convocados a conservar o modelo da sã doutrina e convencer os contradizentes, "retendo firme a fiel palavra, que é conforme a doutrina, para que seja poderoso, tanto para admoestar com a sã doutrina como para convencer os contradizentes." (Tt 1.9).
            A secularização é a principal característica de uma época de utopias, aceitando como boa a vida contemporânea. O anúncio sobre Deus como pregação no mundo secularizado só se consegue por meio estratégias materialistas e formas pragmáticas que mais afastam o homem da Palavra de Deus, porque não leva em conta as Escrituras Sagradas, mas os livros, autores seculares e crentes fora do fundamento dos apóstolos e dos profetas. Esses livros têm a Palavra de Deus, mas não é a Palavra de Deus, eles chegam com a interpretação e recomendações de seus autores. Logo, não se fala pela perspectiva bíblica e, sim, nos conceitos humanos, portanto, nega-se a Palavra de Deus, por conseguinte o próprio Deus da Palavra.
            Está clara nessa divergência que as muitas questões que geram resistência ao estudo sistemático da Palavra de Deus são desenvolvidas por falsos mestres a partir de leituras divorciada da Palavra de Deus. É certo afirmar que para afastarmos essa permissividade da mente de muitos líderes e, principalmente, de muitos púlpitos, será necessário homens cheios do Espírito Santo, que ajam com coragem, retendo firme a fiel Palavra de Deus. Portanto, a igreja necessita de um retorno a verdadeira exegese, cristocêntrica, concebida por meio de estudos sistemáticos da Palavra de Deus, na comunhão com o Pai, pela contrição de um coração devotado em oração e adoração, com a finalidade de repartir exatamente o que o Senhor lhes entregar, a fim de que o povo seja alimento pelo Espírito Santo de Deus.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ALMEIDA, João Ferreira de. Bíblia Sagrada, Edição Revista e Corrigida. 64ª Impressão, Rio de Janeiro, Imprensa Bíblica Brasileira, 1987.

DOCKERY, David S. Hermenêutica Contemporânea à Luz da Igreja Primitiva. São Paulo, Editora Vida, 2005.

HORTON, M. Stanley, A doutrina do Espírito Santo no Antigo e Novo Testamento, 16ª impressão, Rio de Janeiro, CPAD, 2018.

PISETTA, Almiro. Os pais apostólicos [livro eletrônico] / traduzido por Almiro Pisetta. — 1a ed. — São Paulo: Mundo Cristão, 2013. — (Clássicos)

SILVA, Antônio Gilberto da. A Bíblia através dos séculos: uma introdução. Rio de Janeiro, Casa Publicadora das Assembleias de Deus, 1986.

STUART, Douglas e FEE, Grodon D. Manual de Exegese Bíblica, Tradução de Estevan Kirschner e Daniel de Oliveira, 1ª ed. – São Paulo: Vida Nova, 2008.

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